Decisão do STF na ADC 58 e 59 (Tema 1191)
“Descrição:
Recurso extraordinário em que se discute, à luz dos arts. 5º, II e XXXVI, da Constituição Federal a utilização da Taxa Referencial - TR
como índice de atualização dos débitos trabalhistas, haja vista a interpretação conferida pelo Tribunal Superior do Trabalho a julgados proferidos pelo STF (ADI 4.357, ADI 4.425 e RE 870.947, Tema 810 da Repercussão Geral) que levou à declaração de inconstitucionalidade parcial do artigo 39 da Lei 8.177/1999 e a fixação do Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial (IPCA-E) para atualização dos débitos trabalhistas.
Teses Firmadas:
I - É inconstitucional a utilização da Taxa Referencial - TR como índice de atualização dos débitos trabalhistas, devendo ser aplicados, até que sobrevenha solução legislativa, os mesmos índices de correção monetária e de juros vigentes para as condenações cíveis em geral, quais sejam a incidência do IPCA-E na fase pré-judicial e, a partir do ajuizamento da ação, a incidência da taxa SELIC (art. 406 do Código Civil), à exceção das dívidas da Fazenda Pública, que possuem regramento específico. A incidência de juros moratórios com base na variação da taxa SELIC não pode ser cumulada com a aplicação de outros índices de atualização monetária, cumulação que representaria bis in idem.”
A partir da primeira tese, concluímos que é inconstitucional a utilização da TR, como índice de atualização monetária. Isso porque, o Art. 39 da Lei 8.177/1991 estabelece que a TR (TRD) deva ser aplicada como juros de mora. Observe que a tese não declara a inconstitucionalidade da TR, mas o seu uso como índice de atualização monetária.
Para corroborar com essa informação, vamos destacar alguns trechos do voto do Exmo. Sr. Ministro Gilmar Mendes.
“Inicialmente, cabe registrar que a aplicação da TR aos débitos da Justiça do Trabalho foi prevista pela Lei 8.177, de 1991, em seu artigo 39, cujo caput e §1º nunca foram impugnados em ação direta perante esta Corte. Com o Plano Real, a Lei 9.069, de 1995, ao dispor sobre correção monetária, previu expressamente a validade do art. 39 da Lei 8.177 aos débitos trabalhistas. Este artigo também nunca foi declarado inconstitucional pelo STF.” Inteiro Teor do Acórdão – Página 21 de 230.
Como podemos observar, no destaque acima, a TR, como juros de mora aplicados aos débitos trabalhistas, conforme art. 39 da Lei 8.177/1991, nunca foi impugnado.
Continuando a leitura do voto:
“As ações em julgamento trazem novamente a esta Corte a análise da constitucionalidade da Taxa Referencial (TR), agora na Justiça do Trabalho, quer como índice para correção dos depósitos recursais (art. 899, § 4º, da CLT), quer como índice de correção dos débitos trabalhistas (art. 879, § 7º, da CLT e art. 39, § 1º, da Lei 8.177).” Inteiro Teor do Acórdão – Página 29 de 230.
Nesse destaque, observamos que o que estava em julgamento era a constitucionalidade da TR como índice de correção monetária no âmbito da CLT, Art. 899, § 4º da CLT, Art. 879, § 7º da CLT e os juros de mora de 1% do Art. 39, § 1º, da Lei 8.177/1991.
Continuando a leitura do voto:
“Embora, como dito, o STF nunca tenha declarado a inconstitucionalidade da TR per se, reconheço que o entendimento majoritário da Corte tem indicado ou sinalizado a impossibilidade de utilização da TR como índice de correção monetária.” (Grifo no original). Inteiro Teor do Acórdão – Página 57 de 230.
Aqui, o Ministro reconhece que o entendimento da maioria é pela impossibilidade de utilização da TR como atualização monetária, embora o STF nunca tenha declarado a inconstitucionalidade da TR.
Continuando a leitura do voto:
“No entanto, com a ressalva de meu posicionamento pessoal, curvo-me ao entendimento da maioria, em respeito à colegialidade, para concluir que a TR se mostra inadequada, pelo menos no contexto da CLT, como índice de atualização dos débitos trabalhistas. Assim sendo, entendo assistir razão, em parte, à parte autora da ADI, e declaro a inconstitucionalidade da expressão “Taxa Referencial”, contida no §7º do art. 879 da CLT.” (Grifo no original). Inteiro Teor do Acórdão – Página 58 de 230.
Agora, o Ministro declara a inconstitucionalidade da expressão “Taxa Referencial”, contida no art. 879 da CLT, por ser inadequada, como índice de atualização monetária. Até então, nada foi declarado em relação a TR contida no art. 39, caput, da lei 8.177/1991.
Continuando a leitura do voto:
“Valendo-se da técnica de interpretação conforme à Constituição, a proposta que trago à colação é a de que, uma vez afastada a validade da TR, seja utilizado, na Justiça Trabalhista, o mesmo critério de juros e correção monetária utilizado nas condenações cíveis em geral.” (Grifo no original). Inteiro Teor do Acórdão – Página 63 de 230
“Essa solução, ao meu ver, atende à integridade sistêmica do plexo normativo infraconstitucional, já que, salvo disposição em sentido contrário, a rigor, na fase de liquidação da sentença, deve-se observar a regra geral do art. 406 do Código Civil, o qual dispõe que “quando os juros moratórios não forem convencionados, ou o forem sem taxa estipulada, ou quando provierem de determinação da lei, serão fixados segundo a taxa que estiver em vigor para a mora do pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional””. Inteiro Teor do Acórdão – Página 63 de 230
“Atualmente, a taxa dos juros moratórios a que se refere o referido dispositivo (art. 406 do CC/2002) é a taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e Custódia - SELIC, por ser ela a que incide como juros moratórios dos tributos federais (arts. 13 da Lei 9.065/95; 84 da Lei 8.981/95; 39, § 4º, da Lei 9.250/95; 61, § 3º, da Lei 9.430/96; e 30 da Lei 10.522/02).” Inteiro Teor do Acórdão – Páginas 63/64 de 230.
No trecho acima, o Ministro sugere que seja utilizado o mesmo critério de juros e correção monetária utilizado nas condenações cíveis em geral, conforme estabelecido no Art. 406 do CC/2002. Da leitura das Leis citadas acima, observa-se que os tributos federais são cobrados, incidindo a SELIC como juros de mora, a partir do 1º dia do mês subsequente ao vencimento do tributo e de 1% de juros no mês do pagamento.
Para aplicação dos critérios de atualização monetária e juros de mora, o Ministro determina dois períodos distintos.
Fase extrajudicial, prejudicial ou extraprocessual
É a fase que antecede o ajuizamento da ação. Sobre a fase extrajudicial, o voto do Ministro diz:
“Desse modo, fica estabelecido que, em relação à fase extrajudicial, ou seja, a que antecede o ajuizamento das ações trabalhistas, deverá ser utilizado como indexador o IPCA-E acumulado no período de janeiro a dezembro de 2000. A partir de janeiro de 2001, deverá ser utilizado o IPCA-E mensal (IPCA-15/IBGE), em razão da extinção da UFIR como indexador, nos termos do art. 29, § 3º, da MP 1.973-67/2000.” (Grifo Nosso). Inteiro Teor do Acórdão – Páginas 76 de 230.
“Ainda quanto à fase extrajudicial, salienta-se que, além da indexação, devem ser aplicados os juros legais definidos no art. 39, caput, da Lei 8.177, de 1991, ou seja, a TRD acumulada no período compreendido entre a data de vencimento da obrigação e o seu efetivo pagamento. Note-se que a discussão em torno do referido dispositivo dizia respeito à sua aplicação analógica como disciplinadora da correção monetária, à míngua de dispositivo legal específico trabalhista antes do art. 879, § 7º, da CLT. Por outro lado, diante da clareza vocabular do art. 39, “caput”, da Lei 8.177/91, não há como afastar sua aplicação, louvando-se na menção aos juros no art. 883 da CLT, na medida em que este último dispositivo consolidado refere-se exclusivamente à fase processual, sem definir índice ou percentual dos juros, até porque o objeto do comando é a penhora como fase da execução.” (Grifos nossos). Inteiro Teor do Acórdão – Páginas 76/77 de 230.
Para a fase extrajudicial, temos o IPCA-E como indexador, aplicado a partir de 01/2000 e juros de mora TRD, contados do vencimento da obrigação até o pagamento.
Os juros TRD foram mantidos. A uma, porque não foi objeto de impugnação e nem de julgamento. A duas, porque é definido como juros de mora, devido desde o vencimento da obrigação, conforme Art. 39, Caput, da lei 8.177/91. O Ministro deixa claro que o que está sendo julgado é a aplicação análoga da TR como correção monetária, à mingua deste dispositivo legal.
Aqui, faço uma ressalva, quanto a determinação pela aplicação do IPCA-E a partir de 01/2000, uma vez que na Tabela Única de Atualização e Conversão de Débitos Trabalhistas, a TR é aplicada desde 02/1991 até 12/1999.
O que o Ministro quis demonstrar foi a utilização da tabela da Justiça Federal, como podemos os índices que compõem a tabela de atualização monetária para as causas cíveis:
- ORTN de 1964 a fevereiro de 1986 (Lei nº 4.357, de 1964);
- OTN de março de 1986 a janeiro de 1989 (Decreto Lei nº 2.283, de 1986);
- IPC / IBGE de 42,72% - em janeiro de 1989 (Plano Verão - Decisão do STJ);
- IPC / IBGE de 10,14% - em fevereiro de 1989 (Plano Verão - Decisão do STJ);
- BTN de março de 1989 a março de 1990 (Lei 7.738/89);
- IPC/IBGE de março de 1990 a fevereiro de 1991 (Plano Collor I – Decisão do STJ);
- INPC de março de 1991 a novembro de 1991;
- IPCA em dezembro de 1991;
- UFIR de janeiro de 1992 a dezembro de 2000 e IPCA-E do ano 2000 em dezembro de 2000;
- IPCA-E a partir de janeiro de 2001;
Pelo trecho destacado, observamos exatamente o que consta no voto do Ministro, O IPCA-E de 01/2000 a 12/2000, aplicado em dezembro de 2000 e, a partir de 01/2001 o IPCA-E em razão da extinção da UFIR em 12/2000. Isso fica claro na decisão dos embargos de declaração, onde o ministro determina utilizar o Manual de Cálculos da Justiça Federal para esclarecimentos.
Vejamos o que diz a decisão dos Embargos de Declaração:
“QUARTOS EMB. DECL. NA AÇÃO DECLARATÓRIA DE CONSTITUCIONALIDADE 58 DISTRITO FEDERAL
Em relação às supostas omissões quanto aos índices de correção e juros anteriores à utilização do IPCA-E e da TAXA SELIC, registro que a questão foi enfrentada pelo acórdão, devendo o julgador se utilizar do Manual de Orientação de procedimentos para os cálculos na Justiça Federal.” (Grifos nossos). Inteiro Teor do Acórdão - Página 16 de 23
Dessa forma, fica claro que no período anterior ao IPCA-E, deverá ser utilizada a UFIR e o INPC e não a TR conforme divulgado na Tabela Única de Atualização e Conversão de Débitos Trabalhistas, divulgada pelo TRT2.
Fase judicial ou fase processual
É a fase que sucede ao ajuizamento da ação. Quanto a fase judicial, o Ministro se manifestou:
“Em relação à fase judicial, a atualização dos débitos judiciais deve ser efetuada pela taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e Custódia – SELIC, considerando que ela incide como juros moratórios dos tributos federais (arts. 13 da Lei 9.065/95; 84 da Lei 8.981/95; 39, § 4º, da Lei 9.250/95; 61, § 3º, da Lei 9.430/96; e 30 da Lei 10.522/02). A incidência de juros moratórios com base na variação da taxa SELIC não pode ser cumulada com a aplicação de outros índices de atualização monetária, cumulação que representaria bis in idem.” Inteiro Teor do Acórdão - Página 77 de 230
Nesse ponto, o voto estabelece que a Selic, aplicada como juros de mora, não pode ser aplicada cumulada com outro indexador, por tratar-se de bis in idem. Dessa forma, o IPCA-E e os juros TRD que vinham sendo aplicados, desde o vencimento de cada verba, devem ser substituídos pelos juros SELIC.
Por que os juros TRD não constam do dispositivo da ação?
Porque não houve julgamento e nem houve alteração sobre esse tema. Segundo o voto do Ministro, a aplicação da TRD, como juros de mora, permanece como definida no caput do art. 39 da Lei 8.177/91, limitada ao ajuizamento da ação, em virtude da aplicação dos Juros Selic, a partir de tal data.
Como fica a atualização monetária e os juros de mora depois da Decisão do STF na ADC 58 e 59?
Para o período extrajudicial:
- IPCA-E como fator de correção monetária, desde o vencimento de cada verba, até a data do ajuizamento da ação.
- Juros de mora equivalentes a TRD, capitalizada de forma simples, desde o vencimento de cada verba, até a data do Ajuizamento da ação.
Para o período judicial:
- Sem correção monetária.
- Juros de mora equivalentes a Selic, capitalizada de forma simples, desde a data do ajuizamento da ação, até a data do efetivo pagamento
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